Tive a oportunidade de trabalhar em esquema de cobertura de férias na Ilustríssima, que é o caderno dominical da Folha de S.Paulo.Quem conhece o suplemento sabe que ele é aberto à discussão de grandes temas da cultura no Brasil e no mundo.
Quando contei a colegas e amigos que estava no suplemento as reações se resumiram a duas principais: “Nossa, esse caderno é genial!” e “Jura? Como é que você consegue entender esse caderno?”
Sempre fui apaixonada pela Ilustríssima por ela trazer grandes reportagens recuperando o New Journalism (NJ), a junção da literatura com o jornalismo. Aliás, foi esse gênero jornalístico que norteou toda a narrativa do meu livro, o “London Calling“.
O NJ surgiu nos Estados Unidos nos anos 60 com nomes como Tom Wolfe, Gay Talese e Truman Capote, principalmente com o livro “A Sangue Frio”. É a junção das diretrizes do jornalismo, com o registro minucioso de gestos do personagem da pauta; descrição de costumes e hábitos, detalhamento na caracterização e construção das cenas narradas entre outros pontos fundamentais.
É importante detalhar como esse gênero jornalístico surgiu bem nos anos 60. Época de trânsitos comportamentais, agitação hippie, o rock dos Beatles e dos Stones com seus cabelos compridos, a luta pelos direitos civis, surgimento da minissaia deixando os mais conversadores de boca torta… Os escritores/jornalistas se viram obrigados a narrar esses temas efervescentes de uma forma que ultrapasasse os limites convencionais do fazer jornalístico da época.
No Brasil nós tivemos a revista Realidade (1966) que trouxe a sedução da literatura para o texto jornalístico. Mas quem colocou uma pedra nessa harmonização foi a internet, que exigiu do jornalismo uma adaptação nunca antes imaginada. Com textos rápidos, enxutos, às vezes com uma apuração mal acabada.
Fiz esse parenteses do New Journalism para explicar melhor a Ilustríssima, que para mim chega até a ser um alívio poder contar com essa publicação dentro de tanta reportagem rasa que perpassa a mídia jornalística.
Um dos exemplos de textos corpulentos que demos foi sobre a rivalidade Clarín X Kirchner. A reportagem/entrevista trouxe uma nova versão dos fatos tirando o maniqueísmo que a imprensa brasileira implantou entre os dois. Outra muito boa questiona o tráfico de mulheres no exterior, pauta que veio à tona com a novela Salve Jorge, da Globo.
É claro que os textos longos do suplemento assustam (alguns podem chegar até a 18 mil caracteres), ainda mais para nós mortais acostumados com textos de no máximo 2 mil caracteres ou com as reportagens de telejornal com seus 3 minutos de duração.
Palavras rebuscadas e temas mais elitistas também podem afastar o leitor comum da Folha. Algumas vezes me peguei criticando e até tachando de absurdo alguns textos e pautas do suplemento. Em alguns tive que parar várias vezes a leitura da reportagem para buscar no dicionário uma tal palavra que o autor usou, mas até que ponto isso é positivo ou negativo? Isso me levou a incorporar no meu vocabulário uma palavra nova, difícil e que eu nunca usaria, mas não deixa de ser algo novo.
É realmente uma questão de amor e ódio, mas para mim é mais de amor, principalmente pelas grandes reportagens sumidas do nosso jornalismo de papel! E você já teve a oportunidade de ler o caderno? O que achou?